Direto da Tailândia

Minha viagem ao Muay Thai aqui na Tailândia vai chegando ao fim, mas vou compartilhar com todos que gostariam de fazer essa viagem ou gostariam de saber como foi.

Antes de chegar aqui passei um tempo na Holanda, mas vou compartilhar nesta coluna a viagem aqui na Tailândia.

Assim que cheguei ao aeroporto de Bangkok vim direto para o Camp Por Pramuk, um lugar bem afastado, e é onde o bi campeão do K-1 Max, Buakaw Por Pramuk, treina. Cheguei de tarde, por volta das 15hs. Logo na entrada do Camp estava chegando também o Buakaw, que não sei por que não estava muito contente. Vim junto com um amigo holandês que fiz quando morei na Holanda há nove anos.

A recepção de todos no camp não foi muito animadora, estava o Grão Mestre Pramuk, fundador desta escola e os treinadores, que não são de falar muito. Já me levaram para o meu quarto, que era muito simples, como todo o Camp. Fui avisado que o treino da tarde começaria às 16hs e o da manhã às 05h30m.

Troquei de roupa e já fui logo treinar. Quando cheguei, me mandaram colocar um tênis para corrida, isso tudo gestualmente, já que ninguém fala o inglês, e o tailandês é muito difícil de entender. Na corrida da tarde foram oito quilômetros, e ao chegarmos fomos colocados no saco, onde ficamos por mais uma hora. Em seguida me chamaram para bater o pau (bater manopla de Muay Thai), depois me colocaram de novo nos sacos. O treino total após a corrida foi de duas horas, todos os estrangeiros pararam e somente o Buakaw continuou a treinar, totalizando o seu treino em três horas, fora a corrida.

Após o final do treino eu estava muito cansado, já que não treinava assim há muito tempo. Minha sorte foi que, um dia antes de viajar, eu participei da Meia Maratona Internacional do Rio de Janeiro, de 21 km, isso me ajudou na resistência para esses treinos.

Fui avisado que seriam duas refeições ao dia, uma às 10hs da manhã, onde é servido o almoço, e a outra às 20hs, onde tem janta.

Descansamos um pouco e fomos para o jantar, que era feito num lugar sem muita higiene. A comida era uma mistura de açúcar, sal e pimenta, mas muito gostosa, a língua é que pegava fogo. Após o jantar, todos estavam muito cansados e se recolheram para seus quartos, somente Buakaw e mais dois atletas tailandeses ficaram assistindo televisão. Quando cheguei ao quarto, só pensava em dormir para acordar às 05h30m para outra corrida, que até então eu não sabia a distancia. Os meus pés estavam com bolhas, já que se treina descalço no cimento e também não estava acostumado com isso. Devido a diferença do fuso horário de mais de 14 horas do Brasil e sete horas da Holanda, onde eu estava, nem eu e nem meu amigo conseguíamos dormir, fomos dormir por volta das 04hs da manhã.

Acordamos com umas cinco porradas na porta do quarto (desta forma que todos são chamados para as refeições e os treinos), pulamos da cama assustados e muito cansados. Colocamos o tênis e fomos para o refeitório, onde todos se reúnem para passar o óleo tailandês para esquentar o corpo. Lá já perguntei para um espanhol de quanto seria a corrida e ele disse que a da manhã era de 12 km. Mal podia acreditar, já que estava muito cansado e nem tinha dormido direito e os meus pés estavam cheios de bolhas. Sabia que não ficaria bem falar que não iria correr porque estava com bolhas nos pés, no meio da luta existem muitos atletas que arrumam muitas desculpas para não treinar e não queria ser mais um desses. Botei na cabeça que meu pé estava bem e não sentia nada.

Fomos para corrida, Buakaw sempre na frente puxando todos. Ali víamos cobras mortas na pista de terra e logo no asfalto estraçalhadas pelos carros que passam, antes de chegar ao sexto quilometro muitos gringos pararam e começaram a andar. Não sei qual era a temperatura, mas era como se fosse no verão bem quente do Brasil, mais abafado que Belém do Pará. Junto vem um dos treinadores numa moto com varias garrafas de água, que só são entregues para os que completam os seis quilômetros correndo, que pareciam pior do que a meia maratona que eu tinha feito. Somente completaram os 12 km correndo Buakaw, cinco tailandeses e eu, os gringos que eram mais ou menos uns 12 pararam e vieram andando.

Ao chegar da corrida, muito cansado, fui colocar a atadura para o treino e percebi que o treinador que acompanhou a corrida de moto falou o que aconteceu para o Grão Mestre Pramuk. Todos fizeram o treino de mais ou menos duas horas e, como no dia anterior, Buakaw treinou três horas, fora a corrida.

Já naquele momento percebia que não só eu, mas todos os gringos, estavam muito cansados.
Tomei um banho e almoçamos às 10hs da manhã, depois fui para o quarto, onde apaguei e só acordei com aquelas porradas na porta para outro treino, às 16hs. Já nesse treino os gringos não foram treinar e só correram eu, meu amigo holandês, Buakaw e os tailandeses.

Cada dia que passava no Camp os gringos iam indo embora, chegavam, treinavam um dia ou no máximo, três dias, e iam embora.

Os primeiros três dias me sentia pior, a cada dia que passava me sentia muito cansado, e só fui treinar melhor depois do quinto dia, onde meu corpo começou a se adaptar.

O Grão Mestre Pramuk só levanta o braço de quem treina os dois treinos completos todos os dias, não importa se for se arrastando, mas tem que se doar por completo. No quarto ou no quinto dia, o Grão Mestre Pramuk levantou o meu braço, e a partir daí virei como se fosse da família dos tailandeses. Todos vinham se comunicar, brincar, tudo gestualmente, todo o tempo.

Após duas semanas no Camp, só permaneceu eu e mais um francês, dos gringos todos já tinham ido embora, meu amigo foi embora no quinto dia.

O Camp Por Pramuk é conhecido na Tailândia como o Camp de treinamento mais duro, e é por isso que poucos ficam por lá. Além do treinamento duro, é infestado de cobras, lagartos, lagartixas, se olhar para a parede você conta, no mínimo, umas dez. É um lugar muito simples e primitivo, onde se respira o ar puro do treinamento.

Está chegando ao final a minha permanência aqui, fui o primeiro brasileiro a treinar no Camp Pramuk e só posso dizer que para ser um campeão é preciso humildade, não vaidade, deve-se ouvir seu treinador, esquecer badalações, festas, bebidas alcoólicas e treinar e treinar. Os atletas que ficam longe dessas tentações aumentam significativamente as chances de chegar ao topo e permanecer nele.
Buakaw mostrou ser um atleta que treina como poucos, não desfruta da fama que tem na Tailândia e nem no mundo. Enquanto seus adversário desfrutam da fama que tem hoje em festas,viagens e mulheres, Buakaw vai desfrutar de mais um ano de conquista.

Como sempre faço vou deixar uma mensagem positiva.

“Uma dos sentimentos mais nobres que existem é a gratidão, principalmente com as suas origens, que são o pai, a mãe, etc. Se você ama a arte marcial, seu professor passa a ser o seu pai ou a sua mãe. Sempre deve ter o sentimento de gratidão. Os anos passam e a tendência é você querer voltar ao seu passado, relembrar como era estar com essas pessoas e, por isso, deve ter muito carinho por elas, para que sempre você possa ser bem recebido. Nada pode comprar esse sentimento, seu caráter deve estar acima de tudo isso”.

Rush!!!